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A União Interamericana e a Crise Mundial

Em geral, todos os povos da América estão ligados por muitos vínculos, desde tempos remotos, sendo estes laços reforçados progressivamente, influindo sempre fatores idênticos, desde a época pré-colombiana, durante a colonização e, posterior e principalmente, desde a constituição da Independência até nossos dias.

Se desejarmos ter uma ideia exata da significação que entranha a unidade de ação dos povos do Continente no tempo presente, convém, então, dar uma olhada à História para capacitarmo-nos deste assunto e poder deduzir, com sólidos fundamentos, a poderosa e decisiva influência que a América tem e terá, como parte integrante, nos futuros destinos do mundo.

Desde os primeiros habitantes da América, emigrados de diferentes raças e em épocas sucessivas, todas essas imigrações, apesar de trazerem consigo diferentes costumes por pertencerem elas, segundo se tem comprovado, aos diferentes povos asiáticos, preferentemente, em conjunto, toas elas estiveram dotadas do mesmo espírito que impulsiona os aventureiros: ávidos de trabalho que fecunda as mais nobres aspirações humanas, ainda no seu estágio primário de evolução. Assim, mediante o seu esforço secular, que, em parte, se compara com as mais adiantadas civilizações do Mundo Antigo, e, em alguns detalhes, até supera a civilização contemporânea, constituíram dois grandes estados: o grande Império dos Incas e o Império Asteca, sendo que o primeiro abrangia quase toda a atual América do Sul e o segundo, o atual México, parte da América do Norte e os estados centro-americanos de agora.

A avançada civilização desse dois grandes impérios causa admiração aos eruditos que têm dedicado, especialmente, ao estudo do progresso da civilização incásica, comparável com a dos antigos fenícios e com as legislações de Sólon e Licurgo na Grécia!

Os ciclópicos monumentos das ruínas de Cuzco (Peru), Tiahuanacu (Bolívia) e as do México, desafiando os séculos, são testemunhas mudas que nos falam com o intuito de evocar a magnificência e o esplendor duma raça de bronze, capaz de edificar monumentos que, pela sua maravilhosa arquitetura, foram comparados com as pirâmides do Egito. E muitíssimos outros aspectos que demonstram a pujança da raça pré-colombiana nos dois bem organizados impérios, onde reinou a virtude de não ser conhecido o roubo, superando a sua moralidade a outros povos do mundo, pois, entre eles, o Egoísmo e a Ambição não tinham guarida no coração dos governantes, devido, em parte, à imensa extensão dos seus domínios, o que fez com que eles se contraíssem a explorar e conservar as zonas mais frondosas com que a mão de Deus abençoou as mais exuberantes e virgens terras da mais rica Grande Ilha do mundo!

Façamos um estudo comparativo da política interestadual dos dois grandes impérios mencionados, tomando por ponto de partida as sugestões que os animaram durante muitos séculos dedicados cada um deles a elaborar o seu próprio progresso e engrandecimento: desde Manco Capac, fundador da dinastia incaica, até Ataualpa, e desde Mexiti até Montezuma, entre os astecas, ambas dinastias deram exemplo de verdadeiros governantes, não perigando a paz, nem no tempo de Hauína Capac em que o Império dos Incas alcançou o máximo de seu esplendor.

Ambas as civilizações tinham quase idênticos costumes e, apesar das línguas e dialetos que os separavam, desde tempo imemoriável, aqueles povos guardavam os mesmo sentimentos recíprocos. Amantes de sua independência e soberania, mantiveram-se incólumes no decorrer de muitas centúrias, toda a sua existência, mantendo uma paz estável nas duas dinastias que governaram o Continente pré-colombiano, não encontrando-se exemplo paralelo na História Universal! Não existe outro fato semelhantes nas restantes quatro partes do planeta! Exemplo digno de ser imitado!

A fraternidade continental reinou entre esses grandes estados pré-colombianos, determinando destarte uma predestinação histórica para as gerações vindoura, radicando no subconsciente das raças aborígenes a paz internacional!

Com o descobrimento da América, em 1492, inicia-se, com a conquista, uma nova era imigratória que perdura, ininterruptamente, durante os trezentos anos de dominação latina na América. Mas, estas correntes imigratórias traziam consigo as mesmas aspirações, o mesmo espírito aventureiro que, em relatividade, trouxeram os primitivos povoadores da América. Vinham eles à terra promissora, à colônia, onde, sem restrições, podiam expandir as suas atividades neste Novo Mundo, onde a realidade superou a imaginação! Povos dedicados ao trabalho, permaneceram em paz, reproduzindo este fenômeno, novamente, influindo nele a dependência que os ligava aos governos dos quais dependiam.

Posteriormente, em consequência da Independência, principiou uma nova fase imigratória que foi impulsionada, gradativamente, à medida que crescia a fama das riquezas fantásticas nos reinos da Natureza que possuía o solo americano, e aumentavam as facilidades de transporte que, consecutivamente, foram aumentando, enquanto desapareciam os perigos da antiga travessia transoceânica, diminuindo as distâncias de muitos meses a poucas horas!

E estas terceiras correntes imigratórias, traziam consigo as mesma ideias dos primitivos povoadores do Continente, os mesmos ideais dos conquistadores, as mesmas ideias das imigrações dos três séculos de colonização no referente ao trabalho honesto e à superação própria pelo esforço perseverante, debaixo do amparo das leis tão tolerantes e entusiasmadoras para as massas da população dos outros continentes; deixando constância que desde a colonização até o presente, inumeráveis cientistas notáveis desembarcaram nas pacíficas e férteis praias americanas.

Na América do Norte, onde os ingleses não se misturaram com o sangue aborígene, o seu adiantamento foi mais notável. Porém imigrações que foram auspiciadas pelos governantes e vindas de todos os quadrantes do globo, chegaram saturadas das mesmas aspirações de trabalho e de futuro, que não ofereciam as terras gastas da Europa, nem as mesma garantias de Liberdade.

Formou-se, assim, uma geração amalgamada de todas as raças, estabeleceu-se praticamente a forma democrática de governo, iniciada na França, mas, sem as causa propulsoras que intervieram nos Estados Unidos da América do Norte, a Democracia haveria ficado reduzida a uma simples utopia.

O exemplo foi seguido pelas demais nações do Continente: todas estabeleceram a forma democrática de governo, em oposição às velhas formas de governo monárquico, que foi levado a transformar-se em governo monárquico-constitucional e, muito posteriormente em repúblicas, como a China, Espanha, Portugal e outras.

Estas correntes imigratórias, em toda a América, amalgamaram todas as raças, dando origem a dois tipos novos, o “yankee” no norte e o sul-americano.

Destes novos tipos raciais saíram homens de extraordinárias qualidades mentais e espirituais, como Franklin, Fulton, Edison, e com eles, milhares de homens notáveis em todos os ramos do Saber humano. E, na Sul-América, Santos Dumont e outros inumeráveis homens célebres. Todos e cada um dos países da América têm cooperado com os seus homens geniais em todos os ramos da atividade mundial, e, mesmo, com muitas das suas mulheres notáveis! A América, com Thomas Alva Edison, com os seus mais de mil inventos, sendo o mais proeminente a aplicação da força elétrica por ele descoberta, à cabeça, tem contribuído com uma plêiade de homens célebres ao desenvolvimento das Ciências, das Artes e da Literatura. A América fez mais do que juz à civilização e progresso do mundo inteiro!

Os gênios que levantaram e engrandeceram os seus concidadãos e o mundo, nasceram e floresceram em campo propício da paz que engrandece as nações!

Entre os sentimentos cívicos dos cidadãos da América, existe um, profundamente arraigado na consciência, que abrange, sem exceção, a todos: o patriotismo, na América do Norte, simbolizado em George Washington e, na América do Sul, em Simon Bolivar. Ambos, gênios da Liberdade Americana, estão esculpidos no bronze e no granito, em dois belos e grandes monumentos que adornam a capital do grande povo do Norte.

George Washington e Simon Bolivar encarnaram os sentimentos libertários de amas as Américas, fundindo-as num só laço indissolúvel! Lutaram por um só ideal, conforme o declarou em 1921, quando, na presença de todo o corpo diplomático da América e do mundo, o Presidente Harding inaugurou o monumento com que o povo e o governo americanos honravam a memória imponente e majestosa de um dos grandes gênios da liberdade das Américas: Bolivar.

Washington e Bolivar unem os sentimentos pátrios de todos os cidadãos da América! Eles lutaram e mantiveram a Independência da América! Legaram gerações contemporâneas e às vindouras o exemplo permanente das suas excelsas virtudes cívicas!

Monroe, com sua genial visão de estadista notável, profere uma frase que passa a gravar-se em todo o Novo Mundo: “América para os americanos”, sentença que encerra uma advertência que fielmente foi cumprida pelos governantes dos Estados Unidos da América do Norte: não permitir novas conquistas, nem usurpação de territórios em toda América, por povo algum do mundo! Motivos mais do que de sobra tiveram o povo e os governantes norte-americanos para não apartar-se jamais desse rumo na sua política internacional e o cumpriram na primeira vez que foi posta à prova essa política que leva o nome de grande estadista, quando várias potências europeias pretenderam desembarcar na Venezuela.

Outro estadista que, interpretando os sentimentos da América, na República Argentina, num momento de exaltação altruística, manifestando ao mundo os sentimentos humanitários do Novo Mundo, exclamou, plagiando em parte as palavras de Monroe: “América para o mundo”.

Ambas as sentenças não se contradizem; nem a segunda pretende ampliar a primeira. As palavras de Monroe são uma advertência para a conservação da integridade territorial e soberania do Continente; a segunda encarna um ideal genuinamente americanista, porque está no coração de todos nós que viemos à luz neste hemisfério: A América abre suas portas a todos os homens, de todas as raças, de todas as línguas, de todas as crenças, mas que respeitem e cumpram as leis dos países que os recebem com a generosidade dos povos altamente humanitários e conscientes dos seus deveres! Não assim aos que pretendam burlar a hospitalidade que se lhes brinda, conspirando contra as nacionalidades que formam a Grande Pátria Americana!

Assim como, quando existe um perigo nacional, se unificam todas as vontade, cessam todos os antagonismos, todas as crenças, do mesmo modo, estando em perigo todo o Continente, a Pátria das Pátrias, todas estas esqueceram suas antigas divergências e se uniram num só ideal de defesa continental! Magnífico exemplo da sua solidariedade! Este é o resultado do trabalho exercitado durante séculos, educando o caráter e os sentimentos dos homens e das mulheres da América!

Se como escravos estiveram unidos para alcançar sua Independência, como homens livres, todos os americanos, pelas razões antes enumeradas, estarão prontos para defender a sagrada herança legada pelos seus antepassados.

Os grandes presidentes Roosevelt e Vargas simbolizam nestes dias a unidade continental; os dois grandes magistrados contam com a confiança da América. Ambos receberam de todos os povos deste hemisfério, representados pelos seus governantes, as manifestações de indignação e protesto pelos ataques dos países nazistas à esquadra americana e pelos afundamentos dos pacíficos vapores mercantes brasileiros, em águas territoriais brasileiras!

A América está unida! Unida desde seus primitivos fundadores. Unida pelo ideais que tinham os conquistadores. Unidos como povos livres e soberanos e, no estado de progresso em que se encontram hoje, formam um todo digno de respeito pela unidade de ação dos seus governos e povos que os formam, como também pelos vínculos fraternais que, dia a dia, aumentam, tanto pela reciprocidade de intercâmbio dos seus produtos naturais e manufaturados, como pelo intercâmbio dos seus homens de letras! A união interamericana era um fato latente e agora é um completa realidade.

Na Primeira Grande Guerra Mundial, com o grande Presidente Wilson à cabeça, a América contribuiu direta e indiretamente para o término do conflito. Nesta Segunda Grande Guerra Mundial, a América, novamente tomando parte ativa, está chamada a intervir no presente e nos futuros destinos do mundo. E, para isso, dispõe de suas ingentes riquezas dos seus vastos territórios e do heroísmo e valor dos seus filhos, prontos na paz e prontos na guerra pela sua independência!

A América unida se faz respeitável e será respeitada pelos contrários à paz e a fraternidade universal! Não existe, em todo o mundo, um conglomerado igual de nações que reúna consigo todas as forças necessárias para salvar a paz e trazer novos roteiros ao mundo de pós-guerra, para evitar definitivamente o derramamento de torrentes de sangue fratricida, em holocausto do Egoísmo e à loucura da dominação do mundo!

(*) Este documento foi escrito por Julio Ugarte y Ugarte. Não constava data no original. Foi publicado no Boletim Informativo nº 35, Edição Especial.

Em tempo: No Boletim Informativo, após o texto, constava a seguinte Nota Explicativa: O texto A União Interamericana e a Crise Mundial, “Especial para o Correio do Povo”, como o Professor Ugarte escreveu, não possuía data e não chegou a ser publicado. Tomando em conta que:
* após o ataque do Japão ao porto militar de Pearl Harbor, nas ilhas do Havaí, em 7 de dezembro de 1941, os Estado Unidos declaram guerra às nações do Eixo;
* o Brasil declarou guerra à Alemanha em 22 de agosto de 1942, após o afundamento de cinco navios mercantes nas costas brasileiras poucos dias antes; depreendemos que o Artigo do Professor deve ter sido escrito após agosto de 1942.

O Portal Onipotente, pesquisando a história, complementa:
* como Franklin D. Roosevelt encerrou seu mandato presidencial nos EUA em 12 de abril de 1945, ainda antes do término da segunda guerra mundial, que ocorreu em 2 de setembro de 1945, este texto do Professor Ugarte foi escrito após agosto de 1942 e antes de abril de 1945.

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